26 outubro 2008

OS POBRES CAVALEIROS ALADOS*

Hoje é domingo, mais um dia de batalha. Como sempre, alguém sairá vitorioso e conquistará a mais bela entre as dezenas de donzelas e, certamente, a levará para passear em um lugar mágico no qual novas vidas podem ser criadas. As donzelas também travam belas disputas, cada uma com o traje que julgam ser o mais adequado. Algumas usam uma espécie de pó sobre os olhos e umas roupas que, segundo as ninfetas, ajudam na conquista de espaço no cavalo dos guerreiros. Já os guerreiros cavaleiros batalham a semana toda, mas têm suas recompensas nos momentos de lazer. Esses momentos são frutos de muitas economias, pois no Reino dos Cavaleiros Alados os salários não são tão altos assim.
Muitos desses cavaleiros sequer possuem casa fixa, estudo ou muito conhecimento. No Reino dos Cavaleiros Alados isso não é muito importante. Esses cavaleiros possuem os mais belos trajes e os mais belos cavalos, que os ajudam no crescimento pessoal e na conquista de diversos bens importantes, como a fama e principalmente muitas das mais belas donzelas. As demais posses são secundárias e o que importa é o momento, já que no dia seguinte tudo começa novamente. A idade avançada não parece ser problema. Isso porque essas batalhas entre os mais belos e fortes cavalos não são apenas travadas entre jovens. Não é raro ver cavaleiros mais experientes lutando na conquista das jovens donzelas e na marcação de seu território através dos relinchos de seus cavalos. No Reino dos Cavaleiros Alados alguns cavalos são mais importantes do que a vida de diversas pessoas.
Neste reino, a honra de ter o cavalo mais forte e mais preparado vale um duelo de demonstração do poder, garantindo uma reputação para impressionar as donzelas e criar inveja e respeito aos que não têm cavalo. Este ritual de adoração aos cavalos faz com que hajam seguidos desafios entre os guerreiros. O ritual de disputa é muito interessante, valendo a pena ser citado:
– Os cavaleiros se encontram no campo de batalha. A honra está em jogo. Afinal, os cavaleiros precisam mostrar o vigor de seus cavalos alados. É uma batalha que não podem perder, pois cada cavalo alado, com suas armaduras reluzentes, suas patas lustrosas e imponentes, comprovam o quanto estão bem cuidados e são predominantes no reino de “Cavaleiros Alados”. Cuidado este que, em outros tempos, eram para preservação do animal e não uma simples vaidade de seus cavaleiros. Qualquer lugar ou dia é hora para duelar. A plebe, atônita, acompanha cada minutos com um fascínio típico dos grandes espetáculos. Panes et circencis, ou melhor, pão e circo!
O infeliz bobo da corte, com suas roupas alegres, última moda num reino materialista e distante, chapéu com guiso, olhos tristes e cansados, com sonhos tão simples e superficiais, caminha – sempre pensando: “Ah, quem me dera ser um destes cavaleiros! Possuir um belo cavalo e conquistar as mais belas donzelas” – lentamente em direção ao centro do campo de batalha. Portando em suas mãos uma bandeira vermelha, prepara-se para ter seus dois segundos de fama, que assegurarão bom sonhos – que nunca se concretizarão – mais tarde. Empunha a bandeira bem acima da cabeça e, num gesto rápido abaixa sua tola arma. Cavalos disparam sob o comando seguro de seu cavaleiro pela grande pista, dividida por um belo canteiro central e diversos sinais que podem ser entendidos, mas não obedecidos pelos donos dos cavalos. As donzelas levianas acenam seus lenços, decotes e outros acessórios – antes não permitidos por seus pais, mas agora usados a fim de obter a atenção, garantindo assim, um confortável e luxuoso palácio situado no centro do Reino dos Cavaleiros Alados: lar de egocêntricos cavaleiros materialistas.

*Com Carlos Pace Dori